segunda-feira, 31 de julho de 2017

OS ANIMAIS POSSUEM UMA LÍNGUA?


 
 
 
 
 
 
 
            Os animais possuem um sistema de comunicação. Podemos perceber isso quando falamos e interagimos com o nosso cachorro e temos um feedback positivo dessa interação. Os chimpanzés, no zoológico, aparentam conversar entre si de uma maneira muito clara. Os macacos são seres com o grau de inteligência a mais do que os outros animais, porém, eles nunca poderão ministrar uma aula.
            Entretanto, há diferenças, muito bem definidas, entre o sistema de comunicação humana para o sistema de comunicação animal. Um exemplo é que o seu cachorro pode demonstrar suas necessidades básicas, atender alguns comando, perceber o perigo a sua volta, mas nunca terá uma conversa completa com você.
            Nós, humanos, temos um sistema de comunicação muito bem definido, rico em signos, somos capazes de falar em muitos assuntos, avaliamos situações, fazemos o uso da razão. Mas será essa a principal diferença? O uso da razão?
            Há muito anos é dito que nos diferenciamos dos demais animais por temos o dom da razão. O homem é um animal racional já dizia Aristóteles - claro que este conceito tinha um sentido muito mais amplo e completo -. O ser humano é um animal racional por ser detentor de um logos, mas este conceito deve ser repensado, pois os animais também são seres racionais. Se ser racional, nos dias de hoje, tem haver com a capacidade de raciocínio, então um gato também compartilha desta mesma característica. Quando um gato quer subir em um muro, ele faz todo um cálculo mental para ver a possibilidade desse salto. Esse cálculo realizado pelo gato nada mais é do que um cálculo trigonométrico. Os ursos, por exemplo, possuem um raciocínio de causa e efeito de alta complexidade.
            Logo, a resposta para a pergunta anterior é não. O uso da razão não é a grande diferença entre a linguagem humana e o sistema de comunicação dos animais. Para demonstrar as diferenças e similaridades entre esses dois sistemas, iremos destacar três grandes dimensões entre eles, segundo Jackendoff (1999), que são: um conjunto finito de símbolos discreto, deslocamento de lugar e tempo e atenção compartilhada.
            Os seres humanos possuem um conjunto finito de símbolos, que quando combinados produzem uma gama infinita de expressões significativas. Este conceito foi introduzido por Noam Chomsky (1957), em sua teoria modular da mente, inaugurando o marco das ciências cognitivas. Um bom exemplo dessa teoria é o uso do nosso alfabeto com vinte e seis letras, isto é, temos um sistema finito, limitado de caracteres que, a partir dele, podemos combinar e formar diversas palavras, com essas diversas palavras podemos formar sentenças infinitas. O mesmo não acontece com os animais. Os macacos possuem um sistema discreto de símbolos, mas eles não conseguem combinar esses símbolos para formar um sistema mais complicado de comunicação. Portanto, possuímos a criatividade linguística, produzimos frases nunca ditas antes por meio deste recurso mental.
            A segunda grande diferença é a noção de deslocamento. Nós, seres humanos, temos a noção do aqui e do agora. Podemos falar sobre eventos que aconteceram no passado, coisas que acontecem no presente e que poderão acontecer no futuro. Podemos falar sobre outros lugares sem nunca termos ido antes, falamos sobre coisas abstratas, o que seria impossível para os animais. As abelhas, por exemplo, se comunicam por meio do espaço. Elas dançam, fazem um movimento ondulante quando acham mel, mas elas não fazem isso caso realmente não tenham encontrado mel.
            Na linguagem humana, há a noção de atenção e intencionalidade compartilhada. Os seres humanos compartilham dos mesmos objetivos, trabalham em grupo, compartilham atenção em um assunto e concentram-se para atingir uma meta. Para que a vida social tenha sucesso, nós temos a capacidade da empatia, de troca de papéis e fazer análises de julgamento, conseguimos fazer leitura e previsões do nosso próximo, temos mecanismos de rotulação para facilitarmos os nossos relacionamentos. O que já seria impossível na linguagem animal, uma vez que, eles não possuem noções de previsibilidade, tempo e de coisas abstratas.
            Aristóteles, em sua obra A Política, define o homem como o ser mais político entre os animais, dotado da faculdade da linguagem e da fala que, sem ela, seria impossível viver em sociedade, pois a base da sociedade é a comunicação. Somos programados para vivermos socialmente por meio de um sistema virtual chamado língua. Está escrito em nosso código genético, instintivamente, que dotamos dessa faculdade da linguagem e da fala.
            Os animais também compartilham de certo cooperativismo, mas nunca da mesma maneira, complexa, como a dos seres humanos. Eles possuem um sistema de comunicação com alguns símbolos        lógicos e significativos, entretanto, eles não conseguem assumir uma comunicação mais complexa, com noções de tempo e espaço. Esse conjunto de símbolos é usado para suas necessidades mais básicas como comida, reprodução, perigo, afeto e ameaça.
            A grande questão é como pode o sistema de comunicação dos animais ser tão parecido com o nosso? Quais são os aspectos que são únicos da linguagem? E quais são os aspectos da linguagem humana que desenham as habilidades propriamente humana? E quais desses aspectos não são compartilhados pelos os animais? Para esta e muitas outras perguntas ainda não temos respostas, apenas suposições, pois, não existe um registro histórico que catalogue o ponto exato que a faculdade da linguagem se estabeleceu e como ela se desenvolveu ao longo do tempo. A língua é volátil, no momento em que a pronunciamos ela se foi, não existem fósseis, ou algum tipo de registro que comprove seu marco na história.
            Cientistas buscam, incessantemente, a resposta para a origem da linguagem humana e qual o seu ponto de interseção com a comunicação animal. Depois de várias pesquisas, vasculhando as sequências do código genético humano, descobriram um provável gene responsável pela faculdade da linguagem, o FOXP2. Segundo a pesquisa, este gene tende a causar déficits de linguagem, bem como o controle da face e da boca. O gene seria uma forma alterada de um outro gene encontrado nos macacos. Apesar dos grandes avanços da ciência, ainda se sabe muito pouco sobre o assunto, mas o caminho biológico da faculdade da linguagem está sendo aos poucos desvendado.
            Sendo assim, não existe outro sistema de comunicação igual a dos seres humanos. A comunicação animal pode até se aproximar da linguagem humana de uma certa forma, entretanto, será de um maneira rudimentar e limitada. A linguagem nos ajuda em nossas relações e interações diárias com o mundo, podemos nos expressar por meio de vários tópicos, compartilhando milhões de pensamentos com o outro. A linguagem é uma ferramenta cooperativa para os seres humanos. Ela é o que nos torna tão humanos, pois podemos representar e compartilhar pensamentos ilimitados, nos posicionando como sujeitos, agentes da nossa própria história.
           
                       
           
BIBLIOGRAFIA:
 
JACKENDOFF, Ray. 1999. Possible stages in the evolution of the language capacity. Trends in Cognitive Sciences. Vol. 3. nº7. p. 272-279. Julho/1999.
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HOW TO SPEAK TO CHIMPANZEE - Extraordinary Animals - Series 2 – Earth – Disponível em <https://www.youtube.com/watch?v=NBFBbFcixRY> Acessado em 05/01/2017.

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